palarvore é voz que não sustenta o grito e sai rasgando a garganta. um entregalhos coberto de flores enquanto as folhas espalham o vento. Um primeiro livro, uma semente... uma vida de mortes avulsas e semidiárias. tem raiz e juventude na veia. um caule torto, uma expressão própria. palarvore é fruto de vida intensa com um olhar guloso de sumo adocicado. um réquiem do apodrecer da época. um livro sonoro e dissonante que beira as tensões do que é ser humano. um feminino forte do elemento Terra.

o restante...é erva-daninha e pontos

(...)

quarta-feira, 10 de abril de 2013

Concepções Palavras Entransitos II - E a tal presença da ausência e vice-versa

[ Ou (...) Aos Pingos! ]



"Nessa busca incessante de aproximar a arte da vida percebe-se, também, um redimensionamento da ideia do espaço no campo mais geral da arte, redimensionando este que mantém vínculos diretos com os debates travados no campo da fenomenologia e das práticas do neoconcretismo a partir, principalmente, dos anos 60. As propostas neoconcretas, neste sentido, ora se lançam a modalidades vivenciais dos objetos, ora se deslocam para o campo das manifestações ambientais que, rompendo com uma noção de espaço vazio e neutro - receptáculo das coisas do mundo  - se define como um espaço  que incorpora, fenomenologicamente , a ação do corpo do espectador: é um espaço de qualidades afetivas, espaços-afeto, como diria Félix Guatarri, espaços-vivências que se geram a partir da experiência corporal subjetiva. Por outro lado, nessa busca incessante de aproximar a arte da vida, não somente o espaço se vivifica, como também a própria figura do artista se modifica. Longe de desenhar espaços e  universos idealizados, ele torna-se  um construtor de espaços-afeto, um construtor de territórios afetivos, de vivências relacionais."
(Priscila Arantes - Espaço e Performance)



1 - Corrigindo os primeiros "erros", se é que pode-se assim chamar:

      Na performance, não existe erro, isso é um fato. Uma experiência, não pode ser dada por errada por que é uma experiência. Qualquer efeito é efeito, e é válido. Não há regra além da vivência do artista. Porém, há sempre muitos mecanismos de desenvolvimento, de experimentação, de "aprimoramento" ( essa não é a melhor palavra, mas serve), que podem, e devem, ser testados pelo artista para ampliar as possibilidades da sua ação. Chamo de mecanismos as muitas possibilidades que podem ser trabalhadas nessas experiências: Outros objetos, espaços, fluxos de pessoas, vestimentas, temporalidades, e etc... E são esses mecanismos que por necessidade, me fizeram refazer, após repensar, de uma forma completamente diferente, a minha experiência inicial com Palavras Entransitos: Sobre lençóis e chocolates. Apresento-lhes: 
Palavras Entransitos: Sobre as ausências presentes e as presenças ausentes ou (...) Aos pingos!

Palavras Entransitos I ( vamos chamar assim, I e II, devido aos tamanhos dos títulos das vivências...rs), teve por causa, o imprevisto, o em cima da hora, o inesperado, e claro, o afeto (no caso, uma paixão alegre*!)... E isso é bastante visível na estética do registro (lençol) da performance. Levamos vários elementos para uso, porém os mais utilizados foram, o poema (É porque os filmes tristes sempre deixam um amargo na língua que ela adora chocolates), lógico, o lençol, tintas e pincéis, e canetas... Apenas. Não houve de minha parte, uma preocupação explícita, ou um pensamento, na corporalidade da ação. Também não havia um grande fluxo de pessoas pela unirio ( local escolhido para a performance). A ação era escrever, apenas, e jogar com os derramamentos de tinta, com as formigas atravessando o lençol, fazendo nascer novos poemas por acaso. Era tudo que interferiu no trabalho. E repensando esses fatores, pude perceber a importância de elementos que me levassem a outro estado, um estado mais corporal e afetivo, algo que fizesse do "pintar o lençol" algo muito maior do que "pintar um lençol", algo que fosse interessante de ser visto, algo com movimento e densidade, algo verdadeiro, que me afetasse na vida e que também estivesse no livro. Encontrei esse afeto, o afeto que impulsionou Palarvore Entransitos II (Uma paixão triste*, dessa vez) no livro-apêndice de Palarvore: Ele passa e nem percebe a presença que minha ausência tem! Então, comecei a  pensar a ação.

* Segundo as definições de Spinoza

2 - A ideia 

      Compreendendo o fator, de que ideia é a representação de algo no campo do pensamento, desenvolvi minha ação de acordo com meu afeto, minha paixão triste. Considerando a experiência adquirida com Palavras Entransitos I, optei por algumas mudanças: Considerei a importância de uma corporalidade expressiva, talvez, da representação, ainda que subjetiva. Esse movimento deveria corresponder ao afeto. O movimento pode conter várias velocidades, pausas, durações, repetições. Era necessário estar atenta a qualidade desse movimento em relação ao uso dos materiais, que estavam em relação com o afeto, com a presença que a minha ausência tinha. E esses materiais precisavam estar em relação com meu afeto e com o contexto palarvoreano. Então, meus "pincéis" eram:

- Pedaços da caixa quebrada que seria a caixa do press-kit de divulgação do Palarvore, e não foi, e acabou quebrando.
- Gravetos
- Folhas
- Flores de papel crepom oriunda de aulas da unirio
- uma escova de dentes
- E mais uma coisa ou outra que não me lembro
- Lápis de cor  ainda da infância
- Pillots : Pretos e vermelhos

As tintas:

Vermelho: Sangue / Dor / Tristeza
Preto: Solidão / Dor / Escuridão
Amarelo: Alegria do fim / A passagem / A luz ( Porque na vida as coisas passam)

Escolhi essas cores como representação do meu afeto triste. Não tinham nenhuma necessidade se não estas.  Qualquer semelhança com qualquer outra coisa, é mera coincidência. Rs!

Os demais elementos:

- O vinho
- Cigarros
- A cachaça
- MP3 com diversas músicas

(Que na minha concepção, simbolizavam boa parte do que esse afeto me levava a viver na vida. A boêmia. O clássico "afogar" as mágoas. O anestésico "necessário". O ocultar a dor. O entorpecimento. A fuga possível da dor... Etc.)

3 - A inspiração "plástica" e "performativa" do lençol : Jackson Pollock!



      Jackson Pollock apareceu por sugestão do Fábio Cordeiro, que assinou o projeto Palarvore como diretor artístico, em uma conversa sobre como havia sido Palavras Entransitos I, e como eu estava pensando  o Palavras Entransitos II, a questão com o movimento, com os pincéis, com o alcool, os cigarros, e todo aquele afeto real da minha presença ausente, e que eu queria fazer gritar nessa ação. E lógico, tinha absolutamente tudo a ver. Na década de 40, Pollock rompia com os cavaletes, pintando no chão, com telas enormes ( Maiores que meu lençol de casal...rs)  porque dizia entrar dentro do quadro. Ele também não usava pincéis, utilizava a técnica "dripping"  (gotejamento), sendo ele de grande importância para a técnica. Foi um dos maiores representantes do Action Painting. Ele era alcoolátra. Sua esfera de trabalho é a manifestação do inconsciente como prolongamento de si mesmo. Então, era possível relacionar bastante coisa do meu trabalho, do que eu vinha pensando, com a obra desse artista genial, o qual tive a oportunidade de pesquisar com imenso prazer. Era tudo o que eu precisava saber, para desenvolver o movimento preciso, a plasticidade precisa, da minha ação. O próprio ato de Pollock pintando, já era por si só, isoladamente do resultado, uma obra de arte. Uma performance. Sendo a própria obra, um registro daquele momento de entrega do artista, onde ele se submetia a seu inconsciente e criava. Era isso! Havia encontrado. Agora, era só fazer.



4 - A ação: O encontro com a loucura!

     " É o que diziam Deleuze e Guattari quando definiam a obra de arte como um "bloco de afetos e perceptos": a arte mantém juntos momentos de subjetividade ligados a experiências singulares, sejam as maçãs de cézanne ou as estruturas  listradas de Buren."
(BORRIAUD, Nicolas; Estética relacional; Tradução Denise Bottmann)

      Com tudo isso em mãos: meu material afetivo-poético - Ele passa e nem percebe a presença que minha ausência tem, que acabei optando por substituir "Ele" por (...), para deixar mais subjetivo, e porque (...) já era uma marca minha ( Minhas reticências de vista ); Mais os "pincéis" alternativos, mais o alcool, os cigarros, a música, e toda aquela plasticidade Pollockiana em mente... Eu estava pronta para dar início ao Palavras Entransito: Sobre as presenças ausentes e as ausências presentes ou (...) Aos Pingos.


      Trabalhei toda aquela densidade dentro de mim. Era a hora de colocar para fora como uma obra de arte vivente. Comecei respingando as tintas, preta e vermelha no lençol. Ouvia com o corpo todo. Era uma figura estranha, pairava a dor de ser ausência em minha imagem presente. E também a presença da ausência sentida estava em mim representada. Ao menos é o que eu buscava com o meu afeto. Do espectador, a gente nunca sabe. Na verdade, estava ali pra ser subjetivada pelos afetos passantes. Não dava pra saber se os afetos eram os mesmos, e muito provavelmente, não eram. Toda a minha dor expressa, não passava de uma ideia na cabeça de alguém, uma ideia vago, de algo. Acendia um cigarro, que compôs furos no lençol... Reticências... Que compus com esse propósito: de ser furo e reticência. O vinho entrava pra jogo, a cachaça que tinha uma embalagem sacana de remédio tarja preta, entrava pra jogo, a dor entrava pra jogo. 
As pessoas entravam pro jogo, e participavam como queriam. Assistindo, bebendo, passando (...)



O corpo atento respondia aos impulsos cinestesicamente. Sem pensar, o movimento era ágil com o ambiente. Os estímulos usados eram muitos: a presença das pessoas, andando, parando, dizendo, cantando,  a música que eu ouvia, ou não ouvia ( nem todo o momento eu ouvi música ), as cores das tintas, do céu, das roupas, o espaço, sua textura, os objetos, e (...) Tudo era estímulo para o movimento. Ele respondia instantaneamente a todas essas coisas. Eu estava presente. E era afetada. E afetava. Usei os materiais para escrever a frase: (...) Passa e nem percebe a presença que minha ausência tem (...) e a cada um, o meu corpo reagia diferente. Era um estado de tensão iminente. Dado um momento, cantei... " Não tenho nada com isso, nem vem falar, eu não consigo entender sua lógica. Minha palavra cantada pode espantar, e aos seus ouvidos parecer exótica. Mas acontece que não posso me deixar levar por um papo que já não deu, não deu. Acho que nada restou pra guardar ou lembrar... Do muito ou pouco que houve entre você e eu. Nem uma força virá me fazer calar. Faço no tempo soar minha sílaba. Canto somente o que pede pra se cantar. Sou o que soa eu não douro pílula. Tudo que eu quero é um acorde perfeito maior, com todo mundo podendo brilhar num cântico. Canto somente o que não pode mais se calar. Noutras palavras sou muito romântico." - Caetano Veloso -
E cantei essa música algumas vezes, com qualidades de estado bem diferentes. Com intensidades diferentes. 
Quando foi finalizando a ação, que senti o esvaziamento característico do fim, junto ao anoitecer, comecei a jogar o amarelo. A luz, o fim, a passagem... O esgotamento. E então, quando acabei de escrever a frase, e pintar meu "quadro" (...)


 (...)
- O encontro com a loucura ( na subjetividade):
No inconsciente, Stella do Patrocínio!
No branco das roupas.
No estado.
Na dimensão das ações.
Na expressividade.
Na visceralidade. 
                      (Tudo isso!  Dentro do inconsciente!)
(...) 

      Após o derramamento de tinta vermelha, caminhei cantando a canção para o caminho das pessoas no jardim. E lá, fiquei presente, eu e minha ausência. Notáveis.


     
     E quando pensei que havia acabado e retornei ao lençol para guardar as coisas, uma menina chegou, e começou a me provocar. Dizia coisas: Corre. Pula. Pega. Dava comandos de ordem que meu impulso, obedecia. E quando por impulso eu parei de obedecer as instruções dela, por incômodo , ela começou a executar suas próprias ações. Jogamos juntas, até que ela foi, e esvaziou de fato o afeto. Havia chegado ao fim. Eu já podia dar como encerrado. E na troca de roupa, quando tudo havia findado, eu encontrei com ela, e nós conversamos. Ela me disse que havia gostado do que viu, que era denso, visual, mas que não havia visto desde o início. Achou interessante eu jogar com a provocação dela, e que não era a intenção causar o " incômodo" , para ela, era apenas um jogo. E sim! Era também. Ela me perguntou coisas, eu respondi. E ficamos assim. Voltei pra casa aliviada. Uma paixão triste acabou de se tornar eterna, só que pelo lado de fora, não mais dentro. Era exteriorizada. Era do mundo. Não mais minha. Isso era o máximo.

5 - O olhar do outro:

"Para tanto, será lançada a noção de espaço de performação, traduzido como aquele que insere o espectador na obra-proposição, possibilitando a criação de uma estrutura relacional ou comunicacional. Ou seja, o espaço de ação do espectador ampliando a noção de performance como um procedimento que se prolonga também no participador (...) Uma categoria sempre aberta e sem limites".
(MELIM, Regina; Performance nas artes visuais )

      Me chama a atenção o tempo que levei pra relatar de fato o que houve naquela performance. E me chama a atenção também, o fator, que eu considero de suma importância, que entrou pelo olhar do outro, mas que estava desde sempre implícito na minha subjetividade: A loucura. Naquela semana, estava devorando o livro "Reino dos bichos e dos animais é meu nome" , livro da Stella do Patrocínio, organizado pela Viviane Mosé, lançado pela Azougue. E só ficou claro, de que eu havia dialogado com a loucura também na ação, pelo olhar do outro. O Pedro (produtor), que me fez esse apontamento, que de muito me serviu. Tanto, que antes (quase um ano depois, o que é muito incomum de acontecer) de eu escrever esse registro completo da ação, havia organizado com as fotos, uma espécie de registro poético onde eu dialogo a performance com alguns textos do livro, e me dei por satisfeita. Apenas hoje, decidi escrever o que de fato houve. Antes, depois das fotos, não havia necessidade, hoje, houve.
      O olhar do espectador, permanece. A ação acabou, mas os registros a mantém "viva", e continuo recebendo significações que partem da experiência do outro sobre aquilo que eu fiz. Confesso ter que trabalhar com o incomodo acerca da metafísica apontada por duas pessoas. Quando me propus a fazer o Palavras Entransitos II, tive um impulso, uma ideia, um linha de ações e possíveis significações, e o que é mais incrível é que nada disso é certeza de nada ( por estar sempre incluso, o outro).  A metafísica está, mas não é a causa, só está porque está em tudo (Mais até nos chocolates, como na tabacaria do Pessoa). Nunca foi, e se fosse, possivelmente não seria como alguns apontamentos que recebi, o cerne da minha questão. Não há nenhuma religiosidade da minha parte. Nada! Entendo e trato aqui, de ritual ( E nem viria de mim esse conceito) como meramente uma sequência de ações, gestos, atividades. Mais nada. O mais, é externo a mim, e só faz parte, por ser a vida da performance ser prolongada no outro de acordo com a sua vivência própria, a sua perspectiva, a sua potência de subjetividade e significação.
      No entanto, tudo foi se transformando ( e ainda está ) no caminho. No fim, as coisas são sempre imprevisíveis quando se trata de performance. E quem é o outro para julgar o significado? E quem sou eu para julgar a significação? Se quando ando, tenho nas costas a minha bagagem própria, e quando o outro se aproxima, carrega o peso da sua vivência pessoal. Não significa o que é, ou deixa de ser... Apenas significa, de acordo com cada um. De acordo com a participação de cada. Uma grande composição sem ordem! Estranho e maravilhoso! Palavras Entransito III, agora! Será?







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